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O que adianta estar pensando lá (Mind Wandering) se o agora é aqui (Mindfulness)?

Andre Luiz Salsa Vitorino da Silva

28 de Agosto de 2017

A palavra ”meditação”, por si só, já pode remeter à sensação de calma, tranquilidade e foco. Entretanto, com todas as “parafernálias” que o mundo moderno impõe (tal como o ritmo acelerado de trabalho), a mente acompanha os movimentos internos e externos, sequestrando a pessoa, ou melhor, os seus pensamentos, para um lugar bem longe do aqui e agora.

O pagamento desde sequestro, muitas vezes, sai caro. Em outras palavras, quando realizamos uma atividade que exige foco, todos os pensamentos que chegam e que não fazem parte do contexto, ou da tarefa em andamento, constituem o Mind Wandering, fenômeno que coloca em xeque nosso grau de atenção (“mente andarilha”). Tais fenômenos nos fazem questionar: até que ponto estamos concentrados na tarefa que estamos realizando ou quão dispersos estamos na tarefa?

Foi por esta ótica que quatro professores das Universidades de Wartloo (Canadá) e Harvard (EUA) realizaram uma pesquisa com o objetivo principal de verificar se uma intervenção breve com meditação guiada teria efeitos protetores para manutenção da atenção em uma atividade, reduzindo os níveis de Mind Wandering entre indivíduos.

A pesquisa contou com a colaboração de 82 universitários, com idade média de 20 anos. Estes participantes foram selecionados após submetidos ao Strait-trait Inventory for Cognitive and Somatic Anxiety-Trait (STICSA), um questionário utilizado para selecionar pessoas com alto nível do traço de ansiedade, já que pessoas ansiosas tendem a ser bastante distraídas. Posteriormente, os participantes foram testados individualmente e completaram o Mindfulness Attention Awareness Scale (MAAS), um instrumento psicométrico para avaliar a consciência e a atenção na vida cotidiana, assim como a percepção da atenção de modo geral. O MAAS foi incluído neste estudo apenas para verificar se os dois grupos (controle e meditação) eram iguais em suas habilidades de mindfulness antes de participarem da intervenção. O Positive and Negative Affect Scale (PANAS) foi um segundo questionário aplicado para avaliar os estados de humor e verificar os níveis de afeto positivo e negativo.

Em seguida, os participantes foram distribuídos aleatoriamente em dois grupos (grupo de meditação e grupo controle). Todos os sujeitos realizaram o primeiro bloco (pré-teste) do Metronome Response Task (MRT). O MRT é uma tarefa de atenção sustentada em que os participantes escutam vários bipes e devem pressionar uma barra de espaço em sincronia com estes sons (no mesmo ritmo).

Na sequência, os participantes do grupo de meditação ouviram uma gravação de áudio que os instruía a concentrar a atenção na respiração e permanecerem “abertos” para esta experiência, ou seja, estarem com atenção plena no aqui e agora. Vale salientar que, para os autores do artigo, estar com a atenção plena (Mindfulness) significa prestar atenção de uma maneira intencional no momento presente, com uma postura livre de julgamentos. Neste estudo o exercício teve duração de 10 minutos.

Já os participantes do grupo controle foram convidados a sentar-se  calmamente e ouvir os oito primeiros parágrafos do primeiro capítulo da história “The Hobbit” por meio de um áudio-livro.

Na sequência do exercício de cada grupo, todos os participantes realizaram novamente o MRT para avaliar o desempenho na tarefa atencional após a intervenção. Para obter medidas em tempo real do Mind Wandering (i.e., da distração durante a tarefa), eram apresentados os Thought probes ao longo do MRT. Quando estes “probes” (ou pistas) eram apresentados, o MRT era interrompido e os participantes tinham que relatar como estava o seu estado mental (atenção) naquele momento imediatamente anterior à apresentação do probe (por isso thought probes: pistas para avaliar os pensamentos em um dado momento). Por fim, todos responderam o PANAS novamente, dando por finalizado o experimento. Todo procedimento levou em torno de 50 minutos.

Como resultado, os pesquisadores concluíram que a breve prática de meditação Mindfulness foi um fator preventivo do aumento de Mind Wandering em comparação ao grupo controle. Ou seja, as pessoas do grupo controle apresentaram maior frequência de distração na realização da tarefa atencional (MRT). Contudo, este estudo também evidenciou que o treino de meditação Mindfulness foi menos efetivo em sujeitos que relataram altos níveis de afeto negativo, indicando que no contexto de uma prática breve de meditação, a intensidade do estado de humor negativo pode interferir no efeito da prática para pessoas ansiosas.

Portanto, depois de todas estas informações supracitadas, o quanto você (leitor) conseguiu ficar atento ao que estava sendo posto? Ou melhor, numa escala de zero a dez, como está a atuação de Mind Wandering em sua cabeça? O que adianta estar pensando lá (Mind Wandering) se o agora é aqui (Mindfulness)?

Para refletir...

Implicações

De acordo com o estudo, o treinamento consciente da atenção através da meditação ajudou a melhorar o foco da atenção para os estímulos do aqui e agora. Assim, esta intervenção poderia servir como reportório para desenvolvimento de habilidades atencionais para populações clínicas que precisam treinar a atenção, tal como pessoas com déficit de atenção e hiperatividade ou transtornos ansiosos. Estes resultados também sugerem que intervenções que auxiliem a promover melhor atenção e consciência de atividades em curso podem ser úteis para contextos escolares, desde o ensino fundamental até o ensino superior. Ou, ainda, no trabalho, onde as pessoas precisam engajar sua atenção nas tarefas a serem executadas, muitas vezes em ambientes com bastante ruído e distrações.

Limitações da pesquisa

Algumas limitações devem ser consideradas:


1. Uma primeira limitação é a possibilidade do grupo controle ter menos expectativas de melhorar o seu desempenho nas tarefas avaliativas, já que apenas ouviram o áudio-livro. É o que em pesquisa chama-se de efeito de demanda, o qual pode ter sido reduzido no grupo controle.

2. Outra limitação foi que, devido a restrições de tempo, foram incluídos apenas cinco “Thought probes” em cada bloco da tarefa MRT. Desse modo, as distrações durante a realização da tarefa atencional podem ter ocorrido em outros momentos em que não foi perguntado a pessoa se ela estava distraída, por exemplo.

3. Por fim, pode-se pontuar a pouca generalização dos resultados para populações não-clínicas e clínicas. A amostra composta exclusivamente por universitários dificulta a generalização destes resultados para a população em geral, bem como para pessoas com queixas psicológicas específicas.

Materiais Complementares

Se você ficou curioso para conhecer os detalhes da intervenção meditativa realizada nesta pesquisa, clique aqui e escute a meditação guiada de Mark Williams e Danny Penman. 

Para conhecer outros materiais complementares, clique aqui!

Como citar este texto:

 

da Silva, A. L. (2017). O que adianta estar pensando lá (Mind Wandering) se o agora é aqui (Mindfulness)? (Website Alfabetização Científica em Psicologia). Recuperado de: http://alfabetizacaopsico.wixsite.com/home/materia-5-meditacao-mindfulness

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Referência:

O artigo Mindfulness and MindWandering: The protective effects of brief meditation in anxious individuals (2017), de Mengran Xu, Christine Purdon e Daniel Smilek do departamento de pisicologia da Universidade de Waterloo, Canadá e Paul Seli do departamento de psicologia da Universidade Havard, EUA, pode ser lido na revista Consciousness and Cognition clicando aqui. 

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