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A outra face: Reconhecimento de expressões faciais na infância

Victória Niebuhr Loos

08 de Fevereiro de 2017

Como é a habilidade de reconhecimento de expressões faciais emocionais na infância? Esta habilidade é diferente para adultos e crianças? E para meninos e meninas? Um estudo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul teve como objetivo determinar os marcos desenvolvimentais do reconhecimento de expressões faciais emocionais em crianças dos 6 aos 11 anos.

Para as pesquisadoras, saber reconhecer as expressões faciais emocionais de outros sujeitos é uma habilidade extremamente importante, pois ela favorece a comunicação não verbal e auxilia na adaptação ao convívio em sociedade. Esta habilidade é imprescindível na infância, pois a linguagem verbal ainda está em desenvolvimento e é nessa fase que ocorrem as primeiras interações sociais. Além disso, há poucos estudos relacionando o desenvolvimento infantil à habilidade de reconhecimento de expressões faciais emocionais, não havendo um consenso na comunidade acadêmica sobre os marcos desenvolvimentais do reconhecimento de expressões faciais. Deste modo, o estudo justifica a sua importância reforçando a relevância da compreensão e do estabelecimento de etapas (marcos) desenvolvimentais da habilidade de reconhecimento de expressões faciais emocionais.

Esta pesquisa é parte de um trabalho maior, a dissertação de mestrado de uma das pesquisadoras, cujo objetivo foi elaborar um banco de imagens de expressões faciais emocionais infantis (CEPS) para utilizar em estudos sobre esta temática e investigar marcadores de desenvolvimento de reconhecimento de faces emocionais em crianças com idade entre 6 e 11 anos e os efeitos da idade, do sexo e do tempo de apresentação sobre ele. O CEPS é um dos primeiros banco de imagens de expressões faciais produzido inteiramente no Brasil e é um dos primeiros, em âmbito internacional, a utilizar imagens de crianças expressando emoções autênticas/espontâneas (na maior parte dos bancos as imagens são posadas).

Para realizar este estudo, as pesquisadoras selecionaram 520 crianças de 6 a 11 anos de 4 escolas de duas cidades do sul do Brasil.  Os pais das crianças responderam o Child Behavior Check List (CBCL), com o objetivo de identificar aspectos comportamentais e emocionais das crianças e possíveis transtornos psicopatológicos. Já as crianças responderam a Matriz Progressiva de Raven, com o intuito de fornecer dados sobre a sua inteligência e verificar a existência de deficiência intelectual. Nesta etapa, 43 crianças foram excluídas da amostra do estudo, pois apresentaram resultado acima da média no CBCL (escores totais, internalizantes e externalizantes), 2 excluídas por estarem distraídas durante o teste e 1 por não ser possível recuperar os dados da criança. Todas as crianças obtiveram escores acima do limiar de comprometimento cognitivo  no teste das Matrizes de Raven, algo crucial para o bom andamento do estudo. Ao final, restaram 90 crianças de 6 a 11 anos, que foram divididas em 3 grupos para a realização da tarefa de reconhecimento de expressões faciais emocionais. No primeiro grupo (G1), 30 crianças de 6 a 7 anos, 30 crianças de 8 a 9 anos no segundo grupo (G2) e 30 crianças de 10 a 11 anos no terceiro grupo (G3).

A tarefa de reconhecimento de expressões faciais consistia em uma tarefa computadorizada contendo 38 fotos de 15 crianças ( 7 meninas e 8 meninos) expressando felicidade (6 fotos), tristeza (6 fotos), raiva (6 fotos), desgosto (6 fotos), medo (6 fotos) e surpresa (6 fotos) em 3 intensidades (neutra, média, e alta) e selecionadas aleatoriamente do CEPS. As imagens eram em preto e branco e tinham resolução de 300x300, eram exibidas aleatoriamente em dois tempos, 500ms e 1000ms. O computador era posicionado a 60cm de distância do rosto dos participantes para a realização da tarefa. Após a imagem aparecer na tela por 500ms ou 1000ms, uma imagem com um esquema de identificação da emoção e de sua intensidade apareciam na tela por tempo ilimitado para a criança identificar a emoção correspondente e a sua intensidade através do próprio computador.

Os pesquisadores acreditavam que os resultados de seus estudos indicariam: 

a) Uma maior facilidade de identificação de expressões faciais emocionais em crianças de 10 e 11 anos;

b) Que as imagens de expressões com intensidade alta fossem reconhecidas mais facilmente em idades precoces do que fotos de expressões de intensidade média e baixa;

c) Que meninas teriam um desempenho melhor que os meninos no número de acertos e identificações de intensidades;

d) Que as emoções seriam reconhecidas mais facilmente no tempo de exposição de 1000ms do que 500ms;

 

e) Que a alegria seria a primeira emoção identificada em todas as idades, seguida em sequência pela raiva, tristeza, medo, nojo e surpresa.

Os resultados encontrados pela pesquisa confirmaram a hipótese de que a habilidade de reconhecimento de expressões faciais emocionais seguiria o ritmo do desenvolvimento infantil, sendo os melhores resultados advindos do grupo 10-11 anos. Os resultados não corroboraram uma vantagem feminina nesta habilidade e nem uma acurácia melhor aos 1000ms. Raiva e nojo foram reconhecidos com mais acurácia somente em alta intensidade, seguidos pelo medo, conforme o esperado. A média mais baixa de acurácia foi da tristeza, o que já é indicado em outros estudos.

As pesquisadoras também concluíram a partir dos resultados que a alegria é a primeira emoção a ser reconhecida, seguida pelas emoções cruciais para a sobrevivência humana (nojo, raiva e medo) e que este desenvolvimento também segue o curso cronológico, pois a precisão foi maior conforme a faixa etária das crianças aumentava.

Entretanto, as pesquisadoras salientam que é necessária a realização de novos estudos sobre os marcos do desenvolvimento da habilidade de reconhecimento de expressões faciais, principalmente em relação à possíveis diferenças de gênero, idade, etnia e psicopatologias.

Para refletir...

Implicações

Este estudo utiliza um experimento de tarefa computadorizada pioneiro no Brasil, sendo a primeira pesquisa a relacionar a habilidade de reconhecimento de expressões faciais emocionais e o desenvolvimento infantil, não havendo outros estudos para comparar seus resultados. Dessa forma, fornece material para novos estudos e salienta a importância da maturação para o reconhecimento de expressões faciais.

 

Suas reflexões fomentam a discussão sobre o tema, bem como fornecem subsídios para a criação de políticas públicas para o contexto do desenvolvimento infantil direcionadas às habilidades sociais de crianças e adolescentes.

Limitações da pesquisa

Algumas limitações devem ser consideradas:


1. Por utilizar uma tarefa computadorizada com 38 imagens, o projeto corre o risco de ter escolha forçada de respostas, ou seja, para continuar o teste, a criança pode ter assinalado qualquer resposta (sem refletir sua percepção verdadeira) e isto influenciar os resultados.

 

2. Outra limitação foi o uso apenas de imagens de crianças, pois os participantes têm contato com adultos e crianças – talvez o uso de imagens de ambos enriquesse este estudo ainda mais.

 

3. A amostra também poderia ser maior, pois isso contribuiria para resultados mais robustos.

Materiais Complementares

Baralho das Emoções

 

O Baralho das Emoções pode ser confeccionado em casa com a ajuda das crianças ou pode ser comprado em uma versão para uso de psicólogos pelas editoras Sinopsys e Vetor.

       

Ele consiste em cartas com personagens expressando as emoções básicas (raiva, medo, nojo, tristeza, surpresa, alegria) e algumas das emoções mais complexas, tais como vergonha, inveja, orgulho e culpa. A criança deve selecionar uma carta do baralho e identificar a emoção correspondente corretamente. Este baralho pode ser utilizado de diversas maneiras, tanto para jogos de adivinhação entre a criança e um adulto, como para identificação dos próprios sentimentos da criança.

 

É um instrumento indicado para crianças e adolescentes de todas as idades, pois auxilia o reconhecimento das emoções e dos sentimentos, favorecendo o autocontrole e a habilidade de identificar os sentimentos de outras. Também ao reconhecer os próprios sentimentos, as crianças aprendem a se expressar e fazem se entender com mais facilidade, indicando aos outros como agir com ela.

Para conhecer outros materiais complementares, clique aqui!

Como citar este texto:

 

Loos, V. N. (2017). A outra face: Reconhecimento de expressões faciais na infância (Website Alfabetização Científica em Psicologia). Recuperado de: 

http://alfabetizacaopsico.wixsite.com/home/materia-5-1

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Referência:

O artigo Child Emotions Picture Set (CEPS): Development of a database of children’s emotional expressions, de Romani-Sponchiado, Mottin, Romani-Sponchiado, Hertzog-Fonini & Arteche (2015), pode ser lido na revista Psychology and Neuroscience clicando aqui

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