top of page

O que meditação mindfulness tem a ver com criatividade? 

Amanda Scapini

10 de Novembro de 2016

“A-ha!”. Você costuma usar essa expressão? Já teve que usar sua criatividade para resolver algum tipo de problema? Gostaria de saber como ser mais criativo? Um estudo realizado por pesquisadores das universidades de Groningen, nos Países Baixos, e North Dakota, nos Estados Unidos, mostrou que a prática de meditação mindfulness pode melhorar a criatividade. Essa pesquisa, a qual foi publicada em 2012, no periódico Consciousness and Cognition, demonstrou que uma intervenção de meditação mindfulness de dez minutos foi capaz de melhorar o desempenho dos participantes na resolução de problemas por insight – aqueles que envolvem respostas criativas e não-habituais.  

Os autores discutem que, ao longo da vida, enfrentamos diversas situações e aprendemos com elas. Esses aprendizados ficam guardados como atalhos na memória. Assim, quando nos deparamos com problemas semelhantes aos que já vivemos, usamos as experiências passadas para encontrar soluções rápidas. Porém, velhas soluções nem sempre são as mais adequadas, especialmente para problemas novos. Como contornar esse quadro? 

A meditação mindfulness é uma prática em que o foco está no momento presente. Muitos autores traduzem o termo como “atenção plena”, mas outros consideram que essa tradução seja muito simplista: mindfulness envolve uma consciência sem julgamentos, que não se apega a conceitos ou memórias, mas observa as experiências como se estivessem acontecendo pela primeira vez. Considerando que a meditação mindfulness objetiva limitar o conteúdo verbal-conceitual, que é um dos responsáveis pelo surgimento dos atalhos formados pelas experiências anteriores, os autores supõem que esta prática facilite a resolução de problemas de forma criativa, isto é, menos condicionada e pré-definida. 

Para realizar a pesquisa, os pesquisadores conduziram dois estudos. No primeiro, considerado correlacional, foi solicitado que 86 graduandos (43 homens e 43 mulheres) respondessem ao Mindful Attention Awareness Scale (MAAS), um questionário que mensura traços de consciência mindfulness (i.e., o uso desta habilidade, independente da prática). Em seguida, solicitaram que os participantes resolvessem os 5 problemas de Schooler, dos quais 3 envolvem resoluções por insight e 2 por não insight (que demandam raciocínio lógico ou o cumprimento de uma sequência de passos pré-estabelecida), com tempo limitado de 5 minutos para cada problema.

 

Os resultados deste primeiro estudo sugeriram que há relações estatisticamente significativas entre os níveis de traço de consciência mindfulness dos participantes e seus desempenhos na resolução de problemas por insight, mas não com a resolução de problemas por não insight. Ou seja, as pessoas que apresentaram maiores níveis de mindfulness disposicional (i.e., traço de mindfulness) tiveram melhor resolução dos problemas considerados criativos (i.e., por insight). Apesar das correlações significativas, não é possível afirmar com o primeiro estudo que a causa da melhora da criatividade seja o traço de consciência mindfulness, já que nenhuma intervenção foi realizada e variáveis importantes, como o afeto positivo, não foram consideradas. Sabendo dessas limitações, os autores fizeram um segundo experimento.

 

Para o desenvolvimento do segundo estudo, participaram 71 graduandos, dos quais 48 eram homens e 23 mulheres, e dividiram-nos em dois grupos. Todos os participantes responderam ao MAAS, como no primeiro estudo, e a mais dois instrumentos para mensurar traço e estado de afeto positivo (Positive and Negative Affect Schedule e Self-Assessment Manikin – SAM, respectivamente). Posteriormente, um dos grupos ouviu a um áudio de meditação mindfulness guiada por 10 minutos, que continha instruções para trazer a consciência às sensações corporais da respiração e de outras partes do corpo, sem fazer julgamentos (por exemplo, permitir aceitar as sensações do corpo, inclusive a dor).  O outro grupo ouviu um áudio controle, sem meditação. Isto para que os pesquisadores pudessem comparar o desempenho das pessoas que ouviram a orientação para a meditação com o daquelas que não ouviram. Passada esta etapa, todos os participantes resolveram os 5 problemas de criatividade de Schooler (os mesmos do estudo anterior). Todos os componentes dos dois treinos foram ministrados por softwares, de forma que os pesquisadores não sabiam quem era do grupo controle e quem não era.

 

Análises estatísticas levaram os autores às seguintes conclusões: a) os resultados do segundo experimento foram ao encontro dos achados do primeiro estudo: o traço de consciência mindfulness correlacionou-se com resolução de problemas por insight, mas não por não insight; b) mesmo controlando o afeto positivo, o traço de mindfulness continuou a predizer o melhor desempenho na resolução de problemas por insight; c) uma breve indução de meditação mindfulness levou a uma melhor resolução de problemas por insight, mas não por não insight, sugerindo uma relação de causalidade; e d) o estado mindfulness (o efeito da prática) mediou parcialmente a relação entre os efeitos do traço de consciência mindfulness e a resolução de problemas por insight. Assim, esses resultados indicam que mesmo que uma pessoa já tenha naturalmente uma atenção mais plena (como indicaria o traço), a prática de mindfulness propriamente dita também contribui para sua criatividade. 

Para refletir...

Implicações

1. Esse estudo pode contribuir para a elaboração e o teste de práticas acessíveis e eficientes voltadas ao estímulo da criatividade nos mais diversos contextos em que essa se faça necessária, como educacionais e organizacionais. Trata-se de uma intervenção rápida, de baixo custo, que pode ser aplicada em grupos, e que pode ser desenvolvida por qualquer profissional treinado. 

 

2. Por ser pioneira na investigação da relação entre mindfulness e criatividade, esta pesquisa abre espaço na ciência psicológica para que novos estudos sejam realizados, a fim de compreender melhor quais os mecanismos cerebrais envolvidos nesses processos criativos e sua relação com práticas de treinamento mental, tal como meditação mindfulness

Limitações da pesquisa

Algumas limitações devem ser consideradas:


1. O estudo foi realizado em um contexto bem específico, tendo como amostra apenas alunos de graduação. Seria interessante replicá-lo em outros lugares, com amostras maiores e mais diversificadas em escolaridade, idade, raça/etnia, etc., para verificar se os resultados podem ser mais representativos da população em geral. 

 

2. Os autores controlaram apenas o afeto positivo como possível influenciador da relação entre mindfulness e criatividade. Novos estudos podem ser realizados no sentido de verificar se há outras variáveis envolvidas nessa relação, ou se outras escalas que mensurem os mesmos fenômenos apresentam os mesmos resultados do que as utilizadas nesses experimentos. 

 

3. Também é interessante avaliar se diferentes quantidades de prática de mindfulness influenciam o processo criativo da mesma forma, já que neste estudo apenas uma breve indução de 10 minutos foi avaliada. Do mesmo modo, também é importante avaliar o efeito de mindfulness em diferentes processos criativos.

Materiais Complementares

Agora que você sabe que a meditação mindfulness pode melhorar a resolução de problemas por insight, que tal praticá-la? Existem vários aplicativos que podem auxiliar. Esses aplicativos contêm áudios com meditações guiadas, vídeos explicativos, alertas, formas de monitorar o seu progresso e diversos outros recursos! Um deles é o Headspace, disponível em inglês para Android e iOS.

 

Conheça mais sobre o Headspace clicando aqui.

Para conhecer outros materiais complementares, clique aqui!

Como citar este texto:

 

Scapini, A. (2016). O que meditação mindfulness tem a ver com criatividade?  (Website Alfabetização Científica em Psicologia). Recuperado de: 

http://alfabetizacaopsico.wixsite.com/home/materia-2-mindfulness

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Referência:

O artigo Stepping out of history: mindfulness improves insight problem solving, de Ostafin & Kassman (2012), pode ser lido na revista Consciousness and Cognition clicando aqui.

bottom of page